sábado, 27 de outubro de 2012

Territorialidades corporativas 2

Excerto da tese Doutorado Dispositivos territoriais das redes mundiais, PUCSP, 2004. Clara Miranda
O comércio intrafirma acontece em firmas-rede, que são as mais características da produção flexível. Alguns dos segmentos interconectados são tanto autônomos quanto interdependentes da rede, podendo mesmo fazer parte de outras redes. A atuação dessas redes, segundo Manuel Castells (2000), depende de sua “capacidade de conexão”, quer dizer, da “sua capacidade estrutural para facilitar a comunicação livre de ruídos entre seus componentes; e sua consistência, ou seja, o grau até o qual se partilham interesses entre os fins da rede e os de seus componentes”.

A troca de componentes e de suprimentos para cadeias de atividades internacionalizadas intrafirmas têm alçado um alto volume no comércio internacional brasileiro. Das comutações globais, decorre a integração dos mercados, consolidada pela articulação em rede das firmas multinacionais entre sucursais, fornecedores e subcontratantes que representa cerca de 30% do comércio mundial e 50% das importações do Brasil (ANDREFF, op. cit).

Um dos determinantes principais do comércio exterior é a estratégia técnico-financeira da empresa transnacional para a integração industrial. Essa estratégia segue etapas, que envolvem a produção e a comercialização, visando a otimização da estratégia concorrencial global, com o objetivo de consolidar o grupo no mercado global.

A integração industrial transnacional enseja um importante comércio entre os segmentos da empresa-rede. Os preços que governam as transações intra-firma, denominados preços de transferência, possuem determinantes singulares, consistindo numa das vantagens da internacionalização para essas empresas. Destacam-se no comércio intra-firmas em território brasileiro, os grupos PHILIPS, a FIAT, BOSCH, VOLKSWAGEM e a GENERAL MOTORS, segundo a Secretaria de Comércio Exterior (SECEX) do Governo brasileiro (dados até 2004).

Uma das estratégias das firmas transnacionais é baseada na integração em níveis, na qual cada unidade da firma faz parte de uma seqüência da cadeia produtiva, desenvolvendo produtos de uma das etapas ou enviando suprimentos para uma unidade montadora. Esta estratégia atua sobre as importações brasileiras de material eletro-eletrônico, destacando-se a PHILIPS. Sua principal filial brasileira está sediada em Manaus, e é uma grande importadora de aparelhos e material elétricos. As suas compras externas foram realizadas basicamente das próprias filiais da PHILIPS, estabelecidas na China, Japão, Hong Kong e Singapura. Essas subunidades desenvolvem produtos, que são enviados para Manaus, que monta o produto final para venda no Brasil e para exportação. Ressalta-se que essas importações aproveitam o benefício fiscal da Zona Franca de Manaus, que é um fator determinante da concentração deste tipo de importação.

O grupo italiano FIAT é a oitava montadora mundial de automóveis, possuindo 16 fábricas no Brasil, a FIAT Automóveis se destaca entre elas, um dos maiores grupos industriais do país. Um dos fatores que marcam o intercâmbio entre Brasil e Itália é a estratégia técnico-financeira do comércio intrafirma da FIAT. Embora, o intercâmbio venha se reduzindo, componentes, partes e peças para a montagem de carros no Brasil continuaram a ser trazidos da Itália, beneficiando-se da baixa taxa de crescimento italiana e da estabilidade relativa do seu mercado no Brasil. A operação em rede da FIAT envolve acordos intersetoriais com a Siderúrgica USIMINAS, em sua estratégia de desverticalização, esta fornece peças especiais e presta serviços em mecânica e na manutenção de equipamentos.
A multilocalização, descentralização das operações na cadeia mundial de suprimentos e de distribuição da FIAT Automóveis

Global sourcing in the automotive supply chain: The case of Fiat Auto “project 178” world car
Arnaldo Camuffo and Giuseppe Volpato - Ca’ Foscari University of Venice, Italy
 
idem. 
Polos da FIAT Turkey (esq,/ azul), Poland (esq,/ grafite), Argentina (cinza); Italy (dir/ azul) and Brazil (dir/ dir- cinza). Camuffo & Volpato, idem

Territorialidades corporativas 1

Figura apenas firmas de commodities ligadas a minério, celulose e aço
Dois tipos de cadeias se sobressaem: as grandes manufaturas que coordenam as redes utilizando capital e tecnologia intensivamente, mas também obtendo retorno deste uso[1]; e, os grandes varejistas, que subcontratam firmas para realizarem o design de suas marcas. O primeiro modelo é característico de firmas de automóveis, microeletrônica, eletroeletrônica e mecânica pesada, que envolve o comércio intrafirma global relacionado ao Brasil (DUPAS, op. cit ver post anterior referência).


[1] 80% do fluxo de pagamentos internacionais de royalties e fees (transferência de tecnologia) pertencem a 100 maiores corporações do mundo (DUPAS, 2001).

Territorialidade do agronegócio

Excerto da Tese de Doutorado, Dispositivos territoriais das redes mundiais, 2004
Diagrama soja fluxos/ pólos e produtores maiores-hubs, Miranda, 2004


Detalhe das manchas de produção de soja Centro-Oeste/ BAHIA/Paraná/ Minas. Pesquisa de dados no Geipot. Inclui produção de minério/ aço e celulose. Pesquisa Clara Luiza Miranda desenho Patrícia Hulle. Valores em milhões de toneladas

MAPA DAS COMMODITIES
“Nada é mais desterritorializado que a matéria movimento, a matéria-fluxo é vetorial” Deleuze e Guattari
A nova configuração da circulação e a mobilidade geográfica intensiva que ocorrem no território brasileiro, nos anos 2000, advêm principalmente das novas fronteiras agrícolas: cerrados do Centro-Oeste, Triângulo Mineiro, Rondônia, Oeste da Bahia, sul do Maranhão e do Piauí. Estas regiões estão se tornando altamente modernizadas e especializadas, produzindo commodities, sobretudo soja e milho.
A longa distância da nova fronteira agrícola dos portos influi na configuração das redes de circulação, na medida em que multiplica os percursos possíveis no território e que enseja a possibilidade de ampliar o número de saídas, entradas e passagens para o interior do subcontinente.
Estas redes de transporte são açambarcadas imediatamente pelas corporações. Segundo dados da empresa Archer Daniels Midland, a ADM, as chamadas fronteiras logísticas em geral, são consideradas como as últimas etapas que podem ser exploradas para aumentar a praticabilidade das empresas, a fim de manter "vantagens diferenciais competitivas". Abrir novos fronts requer “as atividades logísticas, que afetam os índices de preços, custos financeiros, produtividade, custos de energia e satisfação dos clientes”.
(...)
A estratégia de multilocalização das firmas mundialmente, o intra-firm sourcing, gera lógicas organizacionais, que estruturam cadeias produtivas em forma de redes de empresas, de escala e vínculos diversos: filiais, terceirizações, subcontratações, parcerias. A organização do intra-firm sourcing superpõe-se em camadas, que vão configurando a flexibilização da produção no território, assim como a flexibilização das formas de trabalho, fragmentando-se em agentes menores, que podem gera formas de cooperação territorial tipo clusters, na medida em que se aproxima da base da cadeia expandida (DUPAS, 2001).
"As modificações ocorridas no seio das cadeias produtivas globais, alteram, pois, de modo decisivo, a forma como os países e os agente econômicos relacionam-se entre si, se apropriam da riqueza, alteram o mapa da produção mundial, a demanda por trabalho e a força relativa dos diversos grupos de trabalhadores" (DUPAS, 2001).
O padrão de distribuição territorial é variado, a unidade operativa é a rede e não cada uma das firmas individuais. O que torna a informação, que circula em redes e sub-redes crucial na realização das operações das cadeias produtivas (CASTELLS, 2001). (...)

Referências:
CASTELLS, Manuel. A Sociedade em redes. Tradução: Klaus Brandini Gerhrdt. São Paulo: Paz e Terra, 2000.
DUPAS, Gilberto. O Brasil, suas empresas e os desafios da competição global. In. BARROS, Betania Tanure (org.). Fusões, Aquisições & Parcerias. São Paulo, 2001.


hub/spoke


A rede teia será tratada mediante a expressão “tecido das relações sociais e produtivas” que podem se manifestar mediante “arquiteturas de comunicação” como: ponto-a-ponto e centralizadas hub/spoke, com ou sem integração horizontal feita ponto a ponto no conceito de todos-com-todos (federated), em formações complexas.

A arquitetura da rede centralizada é conhecida como hub/spoke, na qual o hub representa (geralmente) a grande organização, que centraliza as operações em torno de si, enquanto spokes (raios) são as atividades meio ou serviços. Sobretudo, são os circuitos, fluxos, teias, espaços que a circulação desenha, para além das determinações instrumentais e funcionais da produção fabril; é a circulação emancipada da produção.

Independente de uma arquitetura centralizada ou horizontal, as redes mundiais (do capitalismo contemporâneo, da produção flexível) são um “jogo das relações”. A conectividade das cidades globalizadas através das linhas difusas das circulações materiais e imateriais é referida a atributos de fluidez, de fluxo, de mobilidade e as porosidades que rejeitam os mosaicos e os limites.
 
Miranda, Clara Luiza. Tese doutorado. PUC SP. Dispositivos Territoriais das Redes Mundiais. 2004. Orientação Nelson Brissac

Território, territorialidades e redes teias


Ainda seguindo as três metáforas das redes: fluidos, teias e rizomas, sugeridas por Maria Ceci Misoczky, a ideia neste post é abordar as redes teias que caracterizam algumas das redes do modo de desenvolvimento contemporâneo, sobretudo as relativas aos centros de poder.
Dentre diversas questões que caracterizam o território, se diz que ele se organiza de acordo com certos critérios de partilha e de contiguidade, distância (e/ou de condutas sociais de estar junto ou separado; próximo ou distante; só ou em grupo).

De acordo com Milton Santos, em Território, Globalização e Fragmentação (1994), o  funcionamento do território ocorre de modo horizontal por (relação de vizinhança ou continuidade territorial e vertical ‑  mediante pontos distantes uns dos outros, ligados por múltiplas formas e processos sociais.
“ O território, hoje, pode ser formado de lugares contíguos e de lugares em rede: as redes constituem uma realidade nova que, de alguma maneira, justifica a expressão verticalidade. Mas além das redes, antes das redes, apesar das redes, depois das redes, com as redes, há o espaço de todos, todo o espaço, porque as redes constituem apenas uma parte do espaço e o espaço de alguns. São, todavia, os mesmos lugares que formam redes e que formam o espaço de todos” Santos apud ProexUFPE.
Seguindo este raciocínio de redes “hierarquizadas” face territorialidades

Retoma-se o espaço de representação em sua articulação entre o espaço da prática social e a sua materialidade imediata, com implicação temporal-espacial das representações sociais nos remete às relações de poder. O poder é correlato à noção de apropriação e à definição de papéis sociais hierarquizados. Assim uma das formas concretas de apropriação temporal-espacial mediada pelo poder é o território. Este fato assimila territorialidade e poder. No campo das representações sociais o desígnio adjacente de controle e legitimação na definição de territórios, é a noção de territorialidade.

O território é sinônimo de apropriação, de subjetivação fechada sobre si mesma. O seu conjunto dos projetos e das representações desemboca, pragmaticamente, em toda uma série de investimentos, nos tempos e nos espaços sociais, culturais, técnicos, cognitivos. Enfim, a territorialidade aparece nas representações sociais que visam definir as fronteiras de controle e apropriação de determinada realidade social.

Raffestin, no quadro da Geografia Política e se referenciando em Lefebvre, afirma que o território é um espaço modificado pelo trabalho e revela relações de poder . (Saquet. 75). Ele é objeto de relações sociais, de poder e dominação, o que implica a cristalização de uma territorialidade, ou de territorialidades no espaço, a partir de várias atividades cotidianas. Isso se assenta, segundo Raffestin, na construção de malhas, nós e redes, delimitando campos de ação e de poder nas práticas espaciais e constituem o território como materialidade . (Saquet. p76)

Raffestin denomina de sistema territorial o resultado das relações de pode entre Estado, empresas e outras organizações e indivíduos. Atores fazem uma repartição espacial, implantam os nós e constroem redes. Os sistemas territoriais asseguram a coesão espacial e o controle de pessoas e coisas. “As tessiduras, os nós e as redes são subconjuntos que sustentam as práticas espaciais, tanto econômica como política e culturalmente”, concretizando a produção territorial. Essas práticas se inscrevem no campo de poder de maneira relacional Raffestin se baseia em Foucault (Saquet. p, 76).

Raffestin diferencia atores sintagmáticos e atores paradigmáticos na produção do espaço. O ator sintagmático combina todas as espécies de elementos para produzir/ o Estado é o ator sintagmático por excelência. O ator paradigmático deriva de uma divisão classificatória/ critérios individuais e coletivos (apud Galvão; França e Braga.)

De acordo com Raffestin (apud Galvão; França e Braga) Estado e organizações para realizarem objetivos recorrem a estratégias.

Para designar a definição de estratégia recorre-se a Reffestin e a de Certeau. É o “uso do engajamento para fins de guerra” Raffestin (apud Galvão; França e Braga.). Mas, segundo Certeau aquelas práticas, que distinguem um lugar “próprio”, de onde se pode manipular as relações de força, são designadas estratégias. Estas são “um tipo específico de saber”, possuindo no poder a sua face “preliminar”. Certeau contrapõe as estratégias às táticas, que são recursos empregados quando não se domina um lugar “próprio”, quando se tem que jogar num terreno cuja a regra é exterior, e se ocupa o lugar do “outro”. Recorrem-se às táticas quando não se tem condições de possibilidade de um projeto global, e consequentemente, não se obtém individualidade institucionalizada no campo. Deve se operar por “astúcia” em relação ao tempo – aproveitar as “ocasiões”.

No dicionário Metapólis se abre outras vias de abordagem. A estratégia é uma lógica e a tática é um critério, o estratagema é um ardil. A estratégia se refere, pois, a uma lógica global capaz de dirigir as operações; a tática é um conjunto de regras e relações – o dispositivo operativo – necessário para facilitar a “evolução local”. O estratagema é contingente. (verbete Metapólis. p. 211)

Raffestin (apud Galvão; França e Braga, p. 38) diz ainda que as estratégias (militares e jogos) têm em comum: a energia (potencial que possibilita o movimento, a transformação da matéria) e informação (forma ou ordem detectada em toda matéria e energia).

O problema da circulação de informação – a amplitude da dominação do território depende da quantidade de energia disponível. “A circulação da informação estabelece uma comunicação que ocorre num campo de poder e todo poder é desempenhado no campo da comunicação” (Raffestin apud Galvão; França e Braga, p. 38).

A noção de poder multidimensional relaciona Raffestin e Foucault (conceito de biopoder).
Poder gera transmutação, Galvão; França e Braga, p. 40.

A separação entre energia da informação no nível do trabalho realiza fissura social (Raffestin apud Galvão; França e Braga, p. 40)  – tratar disso noutra ocasião.

Segundo Raffestin (apud Galvão; França e Braga, p. 40-41), o  território é um trunfo particular, recurso, entrave, continente e conteúdo, tudo ao mesmo tempo. O território é um espaço político por excelência, o campo de ação do poder. Ver p. 40-41 – CAMPO. Raffestin - espaço é matéria prima anterior ao território. A partir do espaço das ações de apropriações, conduzidas por atores ocorre a territorialização do espaço e o espaço é tornado produto. O espaço é modificado pelo trabalho então revelam-se relações de poder.

Produzir uma representação de espaço já é uma apropriação, uma empresa, um controle, portanto (Raffestin apud Galvão; França e Braga, p. 42).
 
A divisão da superfície: malhas, nós e redes, é um sistema de tessiduras  - nós e redes – organizadas hierarquicamente permitem assegurar o controle sobre aquilo que pode ser distribuído.

Para fazer uma representação moderna do espaço Raffestin (apud Galvão; França e Braga, p. 42 ver 43.-44) destaca a superfície ou plano, linha ou reta e o ponto como elementos essenciais – puro jogo estrutural que transcende os objetos representados mas preserva seus contatos, suas relações.

A territorialidade não é só modelo do espaço, mas também as características dos indivíduos e dos grupos que constituem um território (Galvão; França e Braga, p. 43).

Os cortes e recortes das tessiduras e as ligações entre os nós são explorados através dos conceitos de redes. Ver Galvão; França e Braga p. 44.

Os nós podem ser os centros de poder e de referências das aglomerações de diversas escalas, de indivíduos e de grupos. Os nós são interdependentes, precisam relacionar-se, comunicar-se.

A rede é compreendida na complementaridade entre circulação e comunicação: como fluxos materiais e imateriais (Galvão; França e Braga p. 44).

“A rede é proteiforme, móvel, inacabada, desta falta de acabamento tira sua força no espaço e no tempo (...). A rede faz e desfaz as prisões do espaço tornado território: tanto libera quanto aprisiona. É o porquê de ela ser o instrumento por excelência do poder” (Raffestin apud Galvão; França e Braga p. 44).

A rede descrita por Raffestin é a rede teia.

 

REFERÊNCIAS

GALVÃO; FRANÇA E BRAGA. O território e a territorialidade: Contribuições de Claude Raffestin. In SAQUET & SOUZA, Edson. Leituras do Concieto de Teritório. Expressão Popular, 2009
SAQUET. Abordagens e concepções do território. Expressão Popular, 2010
SANTOS, Milton.  Territorio, Globalização e Fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1994.  
PROEXUFPE.  O conceito de TERRITÓRIO segundo Milton Santos

ESPAÇO POSTULADO/ ESPAÇO PRODUZIDO

O espaço é um “fato” aberto há uma série de especulações. Metodologicamente (e didaticamente) podemos dividi-lo nas categorias espaço postulado[1] e espaço produzido como fez Fábio Duarte (2002). A definição de espaço infinito e abstrato da ciência moderna, que não corresponde as noções adquiridas com a vivência, só pode ser formulado mediante linguagem científica, só pode ser postulado. Mesmo a perspectiva central como técnica de representação do espaço, como construção geométrica, simbólica e ideológica determina um espaço postulado.
O espaço do convívio coletivo, que possui orientação, limites, fronteiras; objetos que o demarcam e obstruem, códigos que os representam e é apropriado pelas pessoas, é o espaço produzido socialmente. Contudo mesmo o espaço produzido carrega fatores ficcionais (ideológicos).
Com base em Henri Lefebvre, quer dizer, baseado em estudos da fenomenologia da gênese do urbano, Fábio Duarte subdivide a compreensão do espaço produzido em três categorias: o espaço praticado, o de representação e as representações do espaço. O espaço praticado é o que permite a formação lenta dos lugares, assegurando a coesão social e determinando segregações. O espaço de representação é o espaço simbólico, é o espaço do tecido social, repleto de signos e modos culturais de apropriação de seus objetos pelos habitantes. O espaço das representações é o espaço concebido. O espaço que “espelha” as relações de produção, a ordem social, a estrutura dos conhecimentos enuncia seus códigos. É o que tende a formar o sistema de signos do espaço (LEFEBVRE apud DUARTE, 2002, p. 43).

[1] Postulado: 1.Filos. Proposição não evidente nem demonstrável, que se admite como princípio de um sistema dedutível, de uma operação lógica ou de um sistema de normas práticas./  2.Fato ou preceito reconhecido sem prévia demonstração.

Com base no conceito de espaço produzido por Fábio Duarte, por sua vez, baseado em Henri Lefebvre. Neste se subdivide a compreensão do espaço produzido em três categorias: o espaço praticado, o de representação e as representações do espaço.

O espaço praticado é o que permite a formação lenta dos lugares, assegurando a coesão social e determinando segregações. O espaço de representação é o espaço simbólico, é o espaço do tecido social, repleto de signos e modos culturais de apropriação de seus objetos pelos habitantes. O espaço das representações é o espaço concebido. O espaço que “espelha” as relações de produção, a ordem social, a estrutura dos conhecimentos enuncia seus códigos. É o que tende a formar o sistema de signos do espaço (LEFEBVRE apud DUARTE, 2002, p. 43). Deste modo se sintetiza:

       espaço praticado→ lugar → pratica do  lugar →  espaço (LEFEBVRE / CERTEAU)

       espaço das representações → território 

DUARTE, Fábio. Crise das matrizes espaciais. Arquitetura, cidades, geopolítica, tecnocultura. São Paulo: Perspectiva, 2002

“Os territórios estariam ligados a uma ordem de subjetivação individual e coletiva e o espaço está ligado mais às relações funcionais de toda espécie. O espaço funciona como uma referência extrínseca em relação aos objetos que ele contém. Ao passo que o território funciona em uma relação intrínseca com a subjetividade que o delimita” Felix Guattari

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

três metáforas de redes


Seguindo as três metáforas das redes Maria Ceci Misoczky — fluidos, teias e rizomas como um, recurso discursivo que possibilita a revelação de multiplicidades, deslocamentos e rupturas.

No caso dos fluidos, quando Pierre Musso , destaca a abordagem mitológica, técnica, médica ‑ biologia, fisiologia, matemática que no Século XVIII indica a “saída do corpo”. Ou seja, a rede não é mais observada sobre ou dentro do corpo humano, ela pode ser construída (...). De natural ela vira artificial, de dada ela se torna construída (...).  A rede pode ser construída porque ela se torna objeto pensado em sua relação com o espaço. Ela se exterioriza como artefato técnico sobre o território para encerrar o grande corpo do Estado-Nação ou do planeta. Para se tornar operacional como artefato a rede deveria ser pensada como conceito. De efeito de rede a ordem de rede.

Os exemplos vieram de engenheiros geográfos e do engenheiro urbanista Ildefonso Cerdá que dizia: “...elementos constitutivos y esenciales (de la influencia transformadora de la nueva civilización de la era industrial del vapor: movimiento y comunicatividad)” (Cerdá TGU_ Teoria Geral da Urbanização). O capítulo sobre “Linhas, Redes e fluxos” In Cidade do Século XIX, Guido Zucconi também ajuda a expor a metáfora da rede fluido.

A rede teia será tratada mediante a expressão “tecido das relações sociais e produtivas” que podem se manifestar mediante “arquiteturas de comunicação” como: ponto-a-ponto e centralizadas hub/spoke, com ou sem integração horizontal feita ponto a ponto no conceito de todos-com-todos (federated), em formações complexas.

A arquitetura da rede centralizada é conhecida como hub/spoke, na qual o hub representa (geralmente) a grande organização, que centraliza as operações em torno de si, enquanto spokes (raios) são as atividades meio ou serviços. Sobretudo, são os circuitos, fluxos, teias, espaços que a circulação desenha, para além das determinações instrumentais e funcionais da produção fabril; é a circulação emancipada da produção.

Independente de uma arquitetura centralizada ou horizontal, as redes mundiais (do capitalismo contemporâneo, da produção flexível) são um “jogo das relações”. A conectividade das cidades globalizadas através das linhas difusas das circulações materiais e imateriais é referida a atributos de fluidez, de fluxo, de mobilidade e as porosidades que rejeitam os mosaicos e os limites.

Mesmo, Michel Serres (1994) enfatiza o papel das malhas e das teias: “que interessam os lugares de armazenamento [hubs], se as redes os interconectam? (...) Quando o estoque se identifica com o fluxo, as grandes concentrações dispersam-se em singularidades”.

Já as características aproximativas de rizoma/ rede são tradadas por Virginia Kastrup com interlocuções com Pierre Levy; e também Suely Rolnik e o próprio Mil Platôs.

sábado, 13 de outubro de 2012

3 respostas à pergunta: O que é uma informação?


Informação, Latour/ Hermandt. Redes que a rezão desconhece: laboratórios, bibliotecas, coleções In Tramas da rede (Parente –org. Ed Sulina,  2010)
Informação não é um signo e sim uma relação estabelecida entre dois lugares — o primeiro se torna periferia e segundo se torna um centro, sob a condição de que entre os dois circule um veículo que denominamos muitas vezes de forma, mas que para insistir em seu aspecto material Latour/ Hermandt chamam de inscrição.

O que é uma informação? Não é inicialmente um signo e sim o carregar em inscrições cada vez mais móveis e cada vez mais fiéis, de um número maior de matéria.

A produção de informações permite resolver de modo prático, por operações de seleção, extração, redução, a contradição entre presença  e a ausência num lugar. Para compreendê-la é preciso se interessar pelas instituições que permitem as relações de dominação e pelos veículos materiais que permitem o transporte e o carregamento.

Diagrama de Latour e Hermandt informação
Algo próximo ao que diz Marshall Mcluhan “o meio é a mensagem” (a forma de um meio incorpora-se na mensagem, criando uma relação simbiótica, que o meio influencia o modo como a mensagem é percebida).

Latour/ Hermandt ressaltam que o signo não remete de início a outros signos e sim ao trabalho de produção concreto, material.

Informação, Vilém Flusser (a partir de Marcos Beccari. Blog Filosofia do design)
FLUSSER, Vilém. Mundo Codificado.
Design e comunicação são, para Flusser, desdobramentos interdependentes de um mesmo fenômeno, a saber, o processo de codificação da experiência. Significa que projetar é in-formar, isto é, dar forma à matéria seguindo uma determinada intenção. De-sign (por/ colocar signos).  Logo, o produto de design é ao mesmo tempo modelo e informação: ao transformar as relações entre o usuário e seu entorno, atribui uma função e um significado ao mundo.

A variação de forma/aparência entre objetos destinados a uma mesma utilização é imensa.  Dado que projetar e in-formar são aspectos de uma única ação, rejeita-se a dicotomia clássica entre representação e referente, signo e objeto, teoria e prática, etc.

De acordo com o pensamento de Flusser, design se torna indistinguível de comunicação ou linguagem na medida em que sinaliza a singular tentativa humana (natural) de impor sentido ao mundo por meio de códigos e técnicas (artificiais). Em suma, significa enganar a natureza por meio da tecnologia – ou simplesmente produzir cultura. Ou seja, realidade, vivenciada coletivamente, se torna real a partir de palavras, imagens e artefatos.Não se trata de um mundo à parte, mas da reconstrução de um mesmo mundo cuja lógica permanece à margem da distinção material-imaterial. “Revela-se, com isso, outro paradoxo: embora o ato de in-formar seja natural ao ser humano, o excesso de informação nos conduz à desagregação de sentido.” (Flusser apud Becari).

Informação, Deleuze
Num primeiro sentido, a comunicação é a transmissão e a propagação de uma informação.

Ora, o que é uma informação?

Não é nada complicado, todos o sabem: uma informação é um conjunto de palavras de ordem. Quando nos informam, nos dizem o que julgam que devemos crer. Em outros termos, informar é fazer circular uma palavra de ordem.

As declarações da polícia são chamadas, a justo título, comunicados. Elas nos comunicam informações, nos dizem aquilo que julgam que somos capazes ou devemos ou temos a obrigação de crer. Ou nem mesmo crer, mas fazer como se acreditássemos.  Não nos pedem para crer, mas para nos comportar como se crêssemos. Isso é informação, isso é comunicação; à parte essas palavras de ordem e sua transmissão, não existe comunicação. O que equivale a dizer que a  informação é exatamente o sistema do controle. Isso é evidente, e nos toca de perto hoje em dia.

No entanto, Deleuze em O Ato de Criação, 1987, diz: suponhamos que a informação seja isso, o sistema controlado das palavras de ordem que têm curso numa dada sociedade.

Mas ter uma ideia não é da natureza da comunicação.

Qual a relação entre a obra de arte e a comunicação?

Nenhuma, diz Deleuze. A obra de arte não é um instrumento de comunicação. A obra de arte não tem nada a ver com a comunicação. A obra de arte não contém, estritamente, a mínima informação. Em compensação, existe uma afinidade fundamental entre a obra de arte e o ato de resistência. Isto sim. Ela tem algo a ver com a informação e a comunicação a título de ato de resistência.

O poder multiplicador das tecnologias sociais | Revista Fórum

O poder multiplicador das tecnologias sociais | Revista Fórum
Programa da TV Fórum debate o conceito e lança oficialmente o 3º Concurso Aprender e Ensinar que premia iniciativas simples, de fácil reaplicação e que valorizam o saber e a experiência popular
Por Adriana Delorenzo
Nesta semana, o programa da TV Fórum na Pós TV trouxe as tecnologias sociais para o debate. Muitas vezes as pessoas desenvolvem e praticam tecnologias sociais, mas desconhecem o conceito. Para multiplicá-lo, a Fundação Banco do Brasil e a Revista Fórum promovem o Concurso Aprender e Ensinar, que está em sua terceira edição e com inscrições abertas. O programa, além de discutir o potencial dessas iniciativas, lançou oficialmente o concurso.
“Queremos dialogar com o professor para que ele possa refletir como aplicar essa discussão do conceito de tecnologia social em sala de aula”, afirmou Claiton Mello, gerente de Educação e Tecnologia Inclusiva da Fundação Banco do Brasil (FBB). O Concurso Aprender e Ensinar premia professores da Educação Básica vinculados à rede pública e de espaços não formais de educação (EJAs e ONGs). Seis vencedores ganharão uma viagem para a Tunísia, onde vão participar do Fórum Social Mundial em março de 2013.
Mas afinal o que são as tecnologias sociais? Como explicou o professor da PUC Ladislau Dowbor, geralmente, a tecnologia é “algo que vem de cima, dos países ricos, de grandes corporações, mas isso pode ser invertido”. Essa inversão ocorre quando a tecnologia vem da base da sociedade. “Não temos que combater as tecnologias, temos que inverter o sinal político, em vez de a tecnologia ser um elemento de dominação, coberto por patentes e royalties, ela pode libertar”, completou.
Existem inúmeros exemplos de tecnologias sociais pelo país, como as cisternas de placa, desenvolvidas pela Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA) e apoiadas pela FBB. A tecnologia consiste em mobilizar as famílias, capacitar os moradores para formar comissões e mão de obra, incentivar o debate sobre os recursos hídricos e adquirir matéria-prima local, fomentando a economia da região. Como destacou Dowbor, “em vez de se ter uma grande empreiteira, você tem um sistema apropriado pela comunidade”.
Na educação, também não faltam iniciativas. Na primeira edição do concurso, em 2008, foram 2.640 inscrições de todo o Brasil. Na segunda, em 2010, o número subiu para 3.075. Hortas de ervas medicinais na escola, a construção de fogão solar e até um banco verde de trocas de materiais recicláveis são exemplos de tecnologias sociais. “O importante é ver como os problemas da comunidade se resolvem e como eles podem resolver os problemas da escola e serem levados à sala de aula”, ressaltou Mello.
Paulo Freire e novos sujeitos
“Há muitas pessoas que fazem, mas não sabem que é tecnologia social, o concurso tem esse aspecto pedagógico de formar. Muitas vezes se faz tecnologia social com outros nomes”, afirmou o professor da USP e diretor do Instituto Paulo Freire, Moacir Gadotti.
Referência na Educação, Paulo Freire desenvolveu uma metodologia que pode ser chamada de tecnologia social, pois contém seus elementos-chave, como o protagonismo da comunidade . Como explica Gadotti, ela respeita o saber do beneficiado e o beneficiado se apropria da tecnologia. “Quando as pessoas entendem o que é tecnologia social, rapidamente, identificam, nas suas práticas, alguma ação concreta”, disse.
Pedro Markun, da Casa da Cultura Digital, concorda que o Brasil pratica muita tecnologia social, embora o nome muitas vezes não seja utilizado. O importante, para ele, é que “o sujeito deixa de ser um mero consumidor e passa a produzir tecnologia”.
Essa questão de se reconhecer como um produtor também foi destacada por Gabriel Fedel, do Fora do Eixo. “Isso está cada vez mais relacionado à dinâmica da sociedade hoje, onde já não somos mais meros receptores, podemos postar escrever, publicar, transmitir pela internet”, afirmou. “As tecnologias sociais têm o poder de ser viral”, completou.
(Colaborou Igor Carvalho)

sexta-feira, 12 de outubro de 2012


Caracterização das redes


O primeiro aspecto discutido no curso sobre a “caracterização das redes” adveio do texto “Filosofia das Redes” de Pierre Musso, que constata.

“A rede é um receptor epistêmico ou um cristalizador, eis por que tomou o lugar de noções outrora dominantes como o sistema ou a estrutura.” (MUSSO, p. 17). Buscou-se a partir dos termos relacionados (em negrito) e emulados pela noção de rede constituir a discussão inicial.

Episteme vem do grego e significa: ciência, conhecimento. Epistemologia é a teoria da natureza e dos limites do conhecimento Japiassu diz que “em um trabalho de pesquisa, a epistemologia tem a função de submeter a prática investigativa a uma reflexão (JAPIASSU, 1979)”. Bachelard designa a diferença entre o ofício de epistemólogo e o de historiador da ciência.

“O historiador da ciência deve tomar as ideias como se fossem fatos. O epistemólogo deve tomar os fatos como se fossem ideias, inserindo-as num sistema de pensamento. Um fato mal interpretado por uma época permanece, para o historiador, um fato. Para o epistemólogo, é um obstáculo, um contra-pensamento. É sobretudo ao aprofundar a noção de obstáculo epistemológico que se confere pleno valor espiritual à história do pensamento científico.” (BACHELARD, Espírito Cientifico).

Inspirado por Bachelard, e outros, Foucault situa a epistemologia como estudo das mudanças na estrutura do conhecimento, como a "gramática" da produção de conhecimento que é revelada pela pratica da ciência, da filosofia, da arte e da literatura. Assim a epistemologia é inclusive um modo de vincular eventos materiais ao pensamento ou ideias. O fato de que uma pratica particular incorpore uma ideia não e evidente por si mesmo; a conexão tem de ser evidenciada na pratica da epistemologia (LECHTE, 2002).

Tanto Bachelard como Foucault mostram como o pensamento, na sua relação com a verdade, tem também uma história, uma estrutura de conhecimento e modos de compreensão que estão eles próprios sempre mudando. . Uma história do pensamento enquanto pensamento da verdade, verdade como processo de objetivação. Objetivação significa problematização (BARBOSA, 1995)

O termo episteme compõe ‘uma’ dimensão que articula uma diversidade de historicidades entre si, segundo Michel Foucault (1995. p. 216) e que coloca ao nível da cultura vivida, sedimentações, canalizações, ligações conscientes e inconscientes entre fenômenos. Essa noção de episteme reforça a situação de composto de relações de forças, passível de ser analisado e desmontado (FOUCAULT, 1995). O confronto de diversas historicidades nos processos analisados, ao mesmo tempo em que reafirma a singularidade dos acontecimentos, aponta a não linearidade do processo histórico. Constrói a ideia de uma história que “(...) recusa a ideologia do progresso, que recusa a continuidade e a identificação com um período dado

Sistema, no dicionário Abbagnano, termo foi e é empregado também sem relação com este significado, para indicar qualquer organismo dedutivo, mesmo que não tenha um princípio único como fundamento. (...).

Sistema, no dicionário Abbagnano e, significa qualquer totalidade ou todo organizado. Sistemas naturais e artificiais, abertos (em contato com o meio socioambiental) e fechados (monopólio). Ainda significa qualquer totalidade ou todo organizado. Neste sentido, fala-se em "S. solar", "S. nervoso", etc, e também de "classificação sistemática" ou, mais simplesmente, de S. em lugar de classificação, como fez Lineu, quando quis insistir no caráter ordenado e completo de sua classificação (Systema naturae, 1735, apud. Abbagnano).

No Glossário de Ruy Gama, sistema significa, Conjunto de elementos relacionados entre si que constituem determinada formação íntegra. Os objetos de um sistema não se decompõem em elementos diversos nem em relação entre estes; não é possível entrar em seu conhecimento se apenas se delimita uma determinada conexão entre as que nele se verificam. A especificidade deste objeto consiste na interdependência de conexões — o objetivo de uma investigação do sistema é a análise lógica e metodológica desta interdependência. Característica — sistemas em geral são representados por modelos, que esquematizam simplificam a complexidade do sistema.

O termo estrutura é o "número-relação", conceito generalíssimo que equivale a plano, construção, constituição (In Abbagnano). A estrutura é construída (não é natural).

O uso do termo estrutura em antropologia, sobretudo por Lévi-Strauss; este define a estrutura explicitamente como um sistema de elementos tal que uma modificação qualquer de um implica uma modificação de todos os outros, considerando-a como um modelo conceituai que deve dar conta dos fatos observados e permitir que se preveja de que modo reagirá o conjunto no caso da modificação de um dos elementos. Lévi-Strauss Apud dicionário Abbagnano.  

Lévi-Strauss – a noção de estrutura não se relaciona à realidade empírica mas aos modelos construídos. É um modo de ajustamento de um conjunto de coisas, partes ou forças que constitui um todo específico. Estas partes estão em conexão ou sinergia com outras, estas se concretizam na relação com essas outras partes. Cada vez que se fala em estrutura é para designar a forma de coerência de um conjunto e a sua heterogeneidade em relação a outros (Lévi-Strauss apud GAMA).

A estrutura é “latente, se inscreve na realidade de modo estável durável.” A apreensão de uma estrutura permite destacar um modelo de funcionamento. O modelo muda quando a estrutura muda.(Ruy Gama, Glossário).

Ainda, referenda-se o uso encontrado na terminologia de Marx e dos marxistas. Nessa terminologia, estrutura é a constituição econômica da sociedade em que se incluem as relações de produção e as relações de trabalho, ao passo que superestrutura (v.) é a constituição jurídica, estatal, ideológica da própria sociedade (Marx In dicionário ABBAGNANO).

Conceito de estrutura de Jean Piaget: "Uma estrutura é um sistema de transformações que comporta leis enquanto sistema (por oposição às propriedades dos elementos) e que se conserva ou se enriquece pelo próprio jogo de suas transformações, sem que estas conduzam para fora de suas fronteiras ou façam apelo a elementos exteriores". Portanto, "uma estrutura compreende os caracteres de totalidade, de transformação e de auto-regulação“ (Piaget).

O conceito rede no texto de Pierre Musso:

Rede é uma estrutura de interconexão instável, composta de elementos em interação e cuja variabilidade obedece a alguma regra de funcionamento (Anne Cauquelin apud MUSSO) definição em 3 níveis:

1- elementos em interação, picos, nós ligados entre si por caminhos ou ligações, sendo o conjunto instável e definido em um espaço em 3 dimensões.

2- rede é uma “estrutura” de interconexão instavel no tempo, é intermitente. A estrutura da rede inclui sua dinâmica — trata-se de pensar um complexificação autoengendrada pela estrutura da rede.

3- A modificação de sua estrutura obedece a alguma regra de funcionamento. Supõe-se que a variabilidade da estrutura em rede respeita uma norma eventualmente modelizável —  que explica “o funcionamento do sistema estruturado em rede”.

Passa-se da dinâmica da rede ao funcionamento do sistema, “como se o primeiro fosse o invisível do segundo, portanto seu fator explicativo”. (Musso. p. 31-32)

Rede define a passagem a transição, o intermediário entre dois lugares. Toda técnica, teoria ou prática da passagem da ligação, o que era o intermediário entre dois lugares, tornou-se substância, não mais intermédio senão totalidade plena (Cauquelin apud Musso, p. 33). Rede técnica de organização espaço-tempo

Como matriz espaço-temporal: “(...) de um lado, a rede técnica abre a restrição espacial sem a suprimir e superpõe um espaço sobre o território — ela desterritorializa e reterritorializa — de outro lado a rede cria um tempo curto pelo rápido transporte ou pelo intermédio ou intercâmbio de informações.

A rede de comunicação adiciona ao espaço-tempo físico um espaço ampliado e um tempo reduzido.

Pode-se confrontar com os conceitos de Stephen Grahan cidade e telecomunicações. Cidade tem a função: fundir tempo com espaço. E foi desenvolvida para facilitar as comunicações pela redução das limitações de espaço, superando as limitações de tempo. Telecomunicações têm a função: Conquistar o espaço com o tempo. Foi desenvolvida para facilitar as comunicações pela redução das limitações de tempo para superar as restrições de espaço.

O território contemporâneo é produzido por meio de superposições, combinações e interações entre territórios. Este aspecto relacional remete ao processo informacional, designando um território multimídia, pois, recorre a multimeios como forma de comunicação, informação e formação. As condições globais dos espaços urbanos estão progressivamente híbridas e multifacetadas, superpõem flutuações e mutações, acumulando camadas de realidade e camadas de informações (GAUSA et al, In Dicionario Metapolis, 2000).

Estas possibilidades se chocam com a condição de objeto da manufatura, compreendido como localização e posição sensível, e com a noção de espaço como aquilo “que impede que tudo esteja no mesmo lugar” (VIRILIO, 1993).


Características das redes segundo Anne Cauquelin: conjunto extensível, auto-organizável, repercutem-se umas sobre outras; a noção de sujeito comunicante se apaga em proveito da produção global de comunicações; anelação (ciclo) ; autonomia; nominação ou prevalência do continente (a rede sobre o conteúdo); redundância ou saturação; construção de uma realidade de segundo grau, simulação (Cauquelin In Arte Contemporânea).

Segundo Pierre Musso, a simbolia da rede coloca o inferno do controle e paraíso da circulação, despotismo do centro e anarquia da periferia. A euforia de um planeta relacional, uma sociedade transparente, consensual e democrática. De acordo com este ponto de vista, as redes de informação ocupariam o lugar de um novo vínculo social e de ferramentas para uma nova democracia eletrônica, direta, interativa e instantânea (Musso).

Pierre Musso ainda destaca a rede veículo que transmuda em passantes sempre mergulhados nos fluxos (de informação, de imagens, de sons, de dados...). O movimento é contínuo, se a república de Platão punha cada um em seu lugar, a democracia reticular põe cada um numa situação de passagem, transição, movimento.

“Não há mais necessidade de operar a mudança social, ela se faz permanentemente”.(...) “A rede se tornou o fim e o meio para pensar e realizar a transformação social, ou até mesmo as  revoluções do nosso tempo” (MUSSO, p. 37).

  

Referencias
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. Martins Fontes.

BACHELARD, Gaston. Formação do espírito cientifico. Editora Contraponto


BARBOSA, Eliana. Espaço-tempo e poder-saber. Uma nova epistéme? (Foucault e Bachelard). Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 7(1-2): 111-120, outubro de 1995.

CAUQUELIN, Anne. Arte Contemporânea - Uma Introdução. Martins Fontes.

FOUCAULT, Michel, Arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense, 1995

GAMA, Ruy. Glossário. EDUSP.

GAUSA, Manuel, GUALLART, Vicente & MÜLLER, Willy et al. (orgs.). Diccionario Metápolis de arquitectura avanzada. Ciudad y tecnologia en la sociedad de la información. Barcelona: Actar, 2000

GRAHAN, Stephen. Rumo à cidade em tempo real. Um extrato desse texto foi publicado por “O Estado de S. Paulo” 26 de maio de 1996.

LECHTE, John. 50 pensadores contemporâneos essenciais do estruturalismo s pos-modernidade. Ed. Difel, 2002


MUSSO, Pierre. A Filosofia da rede In PARENTE, André. As tramas da rede. Sulina, 2004

VIRILIO, Paul. Espaço Critico. São Paulo: Ed. 34, 1993.