sábado, 1 de dezembro de 2012

GaWC Research Bulletin 363

GaWC Research Bulletin 363

Nomos and Space: The Spatial Turn and Contemporary Thought/ P. Perulli


"I could be bounded in a nut-shell, and count myself a king of infinite space"
(W. Shakespeare, Hamlet, II,2)
“Eu poderia viver recluso numa casca de noz e me considerar rei do espaço infinito”.

The epistemological turn / Nomos and Space / The space of interaction / Conflicts over Space / and plurality

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Outros mapas, outros mundos

Outros mapas, outros mundos
O ciberativismo começa a explorar um novo terreno: como o Google Maps e outros sistemas são usados coletivamente para tornar visíveis (e transformar) realidades que a mídia menospreza
Por Sarita Bastos
In Outras Palavras

domingo, 11 de novembro de 2012

Social Network Analysis and Mining - All Volumes & Issues - Springer

Social Network Analysis and Mining - All Volumes & Issues - Springer
OMA/Rem Koolhaas

Negri: “A pobreza não é déficit de ser; o verdadeiro déficit de ser é a solidão” | Blog do Rovai

Negri: “A pobreza não é déficit de ser; o verdadeiro déficit de ser é a solidão” | Blog do Rovai
do La Nacion argentino comtradução Vila Vudu

Antonio Negri é filósofo que atravessa as transformações e os debates do século 20 a partir de uma relação especial entre consistência conceitual e militância política. É pensador que rejeita a imagem do intelectual como ‘profeta’ e que, ao mesmo tempo, valoriza a capacidade da multidão heterogênea e dinâmica.
Sua leitura de Marx vai além do Estado como figura organizadora e reatualiza a ideia de trabalho como capacidade para criar, estabelecer vínculos e organizar novos modos de institucionalidade. Essas novas instituições não se baseiam no pressuposto de que o homem seja “o lobo do homem”, mas numa concepção afirmativa e igualitária das capacidades. Na prisão, encontrou em Spinoza seu principal aliado; ali refletiu sobre a solidão e a comunidade. Chegou a dizer que “é possível, talvez, construir o futuro de dentro do cárcere.”
Em tempos em que a política como potência da multidão é o único antídoto aos fundamentalismos – entendidos como imposição de valores transcendentes em todas as ordens –, Negri defende que “a resistência dos corpos produz a subjetividade não numa condição isolada e individualista, mas num complexo dinâmico no qual se concatenam as resistências dos outros corpos”. Assim, liga a resistência contra novas formas de exploração à produtividade dos corpos coletivos e singulares (experiências populares, organizações sociais e diversos modos de associação entre pessoas). O trabalho não pode ser parcializado nem dividido como em outros tempos; por isso, Negri recorre a uma noção ampliada de corpo como capacidade de compor-se para aumentar a potência; e a um novo olhar sobre a inteligência como ferramenta fundamental.
O Comum supõe tanto as riquezas do mundo material como o conjunto da produção social, os chamados bens naturais (conhecimentos, linguagens, códigos, informação, afetos e suas consequências).
Se o Comum é condição de toda produção de liberdade e de inovação material, são imprescindíveis novas formas de organização, novas instituições emergentes da multidão, que possibilitem que todos tenham acesso e usem o que seja produzido, além de liberdade de expressão e interação. O controle privado, como o controle público, limitam as possibilidades da esfera comum, na medida que separam capacidades, dirigem os movimentos e distribuem funções a partir de lógicas pré-estabelecidas, que foram transformadas em credos durante a história da modernidade.
Negri entende que Spinoza é o subsolo da modernidade, porque ali há uma fonte permanente e contínua de ruptura contra a vontade de dominação e suas modalidades do medo e da esperança. Na fonte de ruptura vive a sabedoria de um poder constituinte, como princípio de mudança e transformação do mundo material. Seu caminho operarista, político e filosófico, o qual, dentre outras coisas levou-o ao cárcere e ao exílio, une Maquiavel, Spinoza, Marx e Deleuze, para insistir en que só a potência comum é ponto de partida de alegrias imediatamente compartilhadas, a partir da autonomia das redes afetivas, sociais e produtivas. Afirma que o essencial para transformar o próprio em comum é o amor que não cessa de abrir-se a comunidades mais vastas que ‘cada um’ e seus mais próximos.
La Nación: Qual a importância do conceito de multidão, para pensar as condições políticas do presente e como o senhor avalia a pertinência da noção ampliada de “multidão dos pobres”, segundo seu mais recente livro, em colaboração com Michael Hardt, Comun. Más allá de lo privado y lo público[1]?
Toni Negri: Quando se fala de “multidão dos pobres”, a primeira referência tem a ver com o nascimento do termo “multidão”. É uma distinção que se deu no marco da Revolução Inglesa, na discussão entre os revolucionários que se manifestam contra a propriedade privada, e os partidários do exército republicano. Os primeiros dizem que representam a “multidão” dos que não têm propriedade; o outro lado diz que representa o “povo”, os que têm como objetivo ter propriedade e a têm. A revolução, claro, decidiu-se a favor da República, quer dizer, dos que têm a propriedade. O ‘outro lado’, os sem propriedade, convertem-se no proletariado que logo ultrapassa o processo de acumulação primitiva e converte-se em classe operária. Desse ponto de vista, há uma dimensão de pobreza, no fato de o vivente viver sem propriedade.
La Nación: Em que medida a transformação pela qual passou o trabalho nas últimas décadas afeta o conceito de “multidão”?
Toni Negri: O conceito de multidão tem sua genealogia nesse processo histórico. Atualmente, o processo acontece com a desagregação da classe operária, a qual está ligada à desintegração do trabalho. O trabalho, na medida em que se transforma em trabalho social, resulta num tipo de atividade que se arranca de uma determinada espacialidade específica dos modos tradicionais de produção. Quer dizer, de um lugar ou uma determinação local e, inclusive, de uma determinação temporal, entendidas como lugar da jornada laboral. A medida do trabalho, antes, estava normalmente dada em relação ao espaço de trabalho e à jornada laboral, os quais contribuíam, por um lado, para reproduzir o capital e fazê-lo frutificar; e, por outro lado, para reproduzir o próprio trabalhador. Hoje, essas medidas clássicas explodiram, tanto espacial como temporalmente. Deste ponto de vista, a multidão deveio multidão de trabalhadores precários.
Mas há outro aspecto relacionado a essa precariedade: a potência social e cooperativa do trabalho. A multidão desagrega-se em singularidades que são, antes de tudo, trabalho vivo: trabalho singular e capacidade de produção que se apresenta como cooperação virtual.
O problema político atravessa tudo isso e inclui revelar como essa multidão virtual, na qual se contém o Comum, consegue expressar-se.
La Nación: O senhor fala então de uma dimensão potente do precário?
Toni Negri: Sim, exatamente. Há uma dimensão potente no precário. Dá-se de um ponto de vista político: a multidão contém a cooperação virtual. Para a cooperação, é importante ver o problema da transição como verdadeiro dilema político. Na Argentina, é problema que foi tratado em sentido forte. Mas onde a transição, como em várias latitudes, não foi problematizada seriamente, ainda se tenta falar de transição, sem considerar a força do fascismo. O sistema capitalista tem absoluta necessidade de manter, seja como for, uma continuidade. Aconteceu no Chile.
Mas esse é problema filosófico de primeira ordem: entender o que é a transição e como afeta a potência social produtiva.
Na Espanha, essa transição está acontecendo agora pela primeira vez, desde a derrota da República: aparece hoje no movimento dos “Indignados”, como reação que redescobre a velha República e entrevê a possibilidade crítica de continuidades potentes.
Raciocinar sobre a potência não é racionar sobre alguma ideia, não é uma ontologia abstrata. Raciocinar sobre a potência é necessidade de uma ontologia concreta, que sempre se apresenta como histórica, que tem natureza plenamente produtiva, nunca vazia.
La Nación: O que significa, por onde passa, então, a potência dessa “multidão dos pobres”?
Toni Negri: A multidão proletária é livre, mas, ao mesmo tempo, reúne-se, une-se, porque a solidão é problema real. A pobreza não é déficit de ser; o verdadeiro déficit de ser é a solidão. É imperioso superar a solidão. A pobreza tem a enorme força de ser trabalho vivo. O pobre é um ser-aí, vivo e efetivo, que se apresenta como índice de associação, de cooperação, de construção. E de construção de ser, porque o ser pode ser construído; o ser não preexiste como fundo. O ser não está sempre por trás; o ser, em cada momento, encontra-se “aí”, existente no momento oportuno em que se rompe a repetição monótona do tempo. É a composição dos afetos, que Marx recupera de Spinoza.
La Nación: Depois da crise argentina de 2001, apareceu uma tensão crescente entre o Estado e os movimentos sociais, os espaços sensíveis ligados aos modos de fazer e de ser, que reclamaram uma certa autonomia. Como o senhor vê essa relação? Em que sentido se pode pensar a emancipação?
Toni Negri: Quando falo de emancipação, não falo num sentido iluminista, nem do modo que me parece que seja a mistificação atual da palavra, ou seu sentido escatológico. Benjamin foi pensador radical, mas foi usado de modo muito ambíguo. Toda essa “escatologia” hebraica e paulina que nos foi oferecida e nos domina no campo teórico, na tentativa de definir a emancipação é o prelúdio transcendente de uma libertação utópica. É preciso recuperar a emancipação em território material.
Com isso, abre-se uma série de perguntas: Como faz o homem endividado, para emancipar-se? Como faz o homem mediatizado, para emancipar-se? O que é representação política emancipada? Que significa a luta de classes? Esses são os grandes problemas da emancipação de nosso tempo. Não há emancipação como conceito derivado da hegemonia, ou simplesmente como proposta simbólica. A emancipação é prática política efetiva de resistência e criação cooperativa.
La Nación: Como, então, o senhor vê o movimento das singularidades e a continuidade do sistema de representação?
Toni Negri: O problema é que a Constituição permaneceu igual. No presente, é imprescindível perguntar: o que significa modificar a Constituição? O que quer dizer introduzir na Constituição, além do privado e do público, também o Comum? O que quer dizer introduzir a participação no lugar da representação? O que significa a gestão comum das empresas, dos bens comuns, do saber, do trabalho?
Essas são as coisas concretas que interessam. São as coisas que se apresentam à multidão dos pobres e dos indignados – de fato, apresentam-se a todos – como coisas fundamentais, embora às vezes os problemas sejam tratados como se fossem caricaturas.
Não se pode falar de singularidades, se não se fala dos novos modos de constituir o saber em relação com as tecnologias, com as finanças, com as forças de trabalho em transformação. Vale para Deleuze, para Virno, como para nós. Falamos de uma produção de mais-valia que atravessa a inovação dos processos de linguagem. É o que temos de problematizar. Em torno disso se devem construir as estruturas políticas.
La Nación: Que relação o senhor encontra entre o conceito mais contemporâneo de “biopolítica” e o conceito mais clássico de “força de trabalho”?
Toni Negri: Força de trabalho é conceito que, evidentemente, vive no interior da noção de capital. Ao mesmo tempo, constitui um problema político que atravessa a vida. Seu movimento é, por um lado, o capital variável; e, por outro, o trabalho vivo. O próprio conceito de força de trabalho deve romper-se de dentro para fora, para devir trabalho vivo independente. Esse conceito de trabalho vivo independente é fundamental, porque removeu toda a temática operária, quando aconteceu na Europa, há 30 ou 40 anos. Vale a pena, então, perguntar-se o que é a independência do trabalho vivo.
Esse é o problema que está no coração do pensamento de Gilles Deleuze e de Paolo Virno, que, adiante, nas obras deles, adquire forma filosófica. Sim, o pensamento de Giorgio Agamben aborda esse tipo de problemas, mas em termos negativos. Em vez de “trabalho vivo”, Agamben fala de “absoluta pobreza”; em vez de força de trabalho organizada, fala de “regra”. Assim recorre à abstração de nível máximo, embora o problema permaneça onde estava.
Em nosso caso, “libertar” não é mais um problema místico ou escatológico: é problema de reforma constitucional, um problema de definir os regimes de propriedade, de tratamento dos regimes monetários, bancários, financeiros. A filosofia crítica contemporânea tem de abandonar a filosofia ocidental, nos seus níveis máximos de abstração. A filosofia pode ser dada por morta, se pretende pensar os problemas das formas de resistência e de liberdade, de modo negativo e abstrato.
Para a ética e para a política, é necessário voltar às palavras que significam e que afetam as práticas em processos históricos de longa duração.
La Nación: Falávamos antes de “emancipação”. Como o senhor vê a obra de Jacques Rancière?
Toni Negri: Mantenho ótima relação com o pensamento de Rancière, tanto de um ponto de vista filosófico, como de um ponto de vista pessoal. Rancière é a pessoa mais contraditória do mundo. Por um lado, chega a uma definição da política, para pensar a distribuição do sensível, a qual, simultaneamente supõe um regime da police e um regime da pólis. É exatamente o que eu teorizo como poder constituinte e poder constituído (na linguagem da tradição, podem ser pensados como potentia e potestas). Rancière também faz uma história que é extremamente plena, cheia de conteúdos históricos determinados: a dos primeiros socialistas que construíram uma relação política intensa, como, por exemplo, em seu livro A noite dos proletários ([1988] Lisboa: Antígona, 2012). Mas, por outro lado, parece, ao meu ver, negar a história, quando teoriza em forma abstrata modelos políticos muito gerais, a partir de problemas sensíveis. Quando alguém se encontra com as duas partes, a coisa aparece como completamente contraditória, mas Racière a resolve, à sua maneira, nas abordagens estéticas.
Minha impressão é que, na estética, ele junta esses problemas numa dupla completamente separada: por uma parte, exalta o momento da política; pela outra, o momento da genealogia, ou da história desconstrutiva. Mas entendo que não consegue juntar uma à outra. Digamos que A noite dos proletários é a solução para seu problema teórico.
La Nación: Como o senhor pensa, na atual conjuntura global, os problemas que se veem na Europa e na América Latina?
Toni Negri: Entre 2004 e 2005 escrevi, com Guiseppe Cocco, um livro intitulado Glob(AL): Biopoder e luta em uma América Latina globalizada (Rio de Janeiro: Record, 2005), no qual fazíamos uma previsão, com exemplos provavelmente não muito adequados, mas bastante precisa, porque víamos que a América Latina estava saindo da dependência. Estava superando a dependência e entrando na ordem global. Você nem imagina as coisas que nos disseram! “Você nega o imperialismo, quer destruir os movimentos subversivos”. Respondo que “O problema é reconhecer que estão, sim, saindo da dependência. Organizem-se para mobilizar os movimentos sociais para dentro do Estado e contra o Estado.”
La Nación: Mobilizá-los para dentro e contra o Estado?
Toni Negri: Sim, para dentro e contra. O problema da liberdade política dos movimentos sociais que aspiram a uma democracia radical é sempre esse. Mas é preciso estar muito atento, porque essa é também a regra dos oportunistas: “metem-se dentro, para depois fazer outra coisa”. Para dentro e contra não são dois movimentos: é um só movimento simultâneo.
Tenho tido contatos com quase todos os países da América Latina, nos últimos anos, e a cada dia é mais evidente uma transformação radical. No Chile, por exemplo, era inimaginável uma revolta de estudantes como a que se viu ano passado e que permanece muito presente nas linhas que abriu. É a lucidez de rapazes e moças de 18 anos? São de uma maturidade política surpreendente. Houve uma transformação antropológica na América Latina nos últimos 10, 15 anos, que afetou o exercício político. A vitória de Lula, ou o ano 2001 argentino são dados fundamentais para avaliar uma irrupção transformadora. E, por outro lado, havia toda uma linha da esquerda que olhava na direção de Chávez.
Sempre fui muito realista sobre os processos que considero importantes. O Brasil, por exemplo, começa a reconhecer-se, não na dependência, mas na interdependência global, e, nesse contexto, está resolvendo seu imenso problema racial que, contudo, ainda existe. A favela começa a ser um lugar que não está fora da cidade, fora da pólis. Começa a haver um Welfare: uma situação de assistência generalizada, uma “escola” que começa a se abrir. Esses são os grandes problemas que a América Latina está enfrentando.
Há companheiros que dizem que o grande momento já foi superado e que, agora, estamos entrando num momento de estabilização, que a crise mundial opera de tal modo, que consegue meter paus na engrenagem, bloquear a imaginação que se tem de aplicar à política. Não sinto que se possa esgrimir juízo definitivo.
Acredito que a América Latina deu um grande passo e foi, inclusive, mestra de trajetórias revolucionárias. Penso nisso, nem tanto pelos Zapatistas, mas, mais, pelos movimentos sociais argentinos e brasileiros. Essa é a conjuntura em que se dá a novidade da relação movimentos sociais-governos, que corresponde a uma situação geral de uma crise do Direito. Hoje já não é possível buscar um Direito que funcione de modo dedutivo: ius publicum europaeum. É preciso inventar jurisprudência a partir do poder constituinte da multidão.
La Nación: O Direito parece funcionar só sobre questões particulares?
Toni Negri: É. Só funciona sobre questões que têm a ver com elementos de contratos, de consenso, de conflito. Se se vê o fato de que alguns movimentos sociais entram no campo da ação governamental, isso não significa que os movimentos venceram; significa que os governos sentiram a necessidade de abrir-se. Quanto a isso, também, é preciso atenção máxima, porque, ao exaltar um aspecto, pode acontecer de descuidarmos do outro lado do problema. Seja como for, tem havido sucessos muito importantes na América Latina que seria necessário ampliar.
A Europa, por sua vez, está em situação completamente diferente. A Europa está completamente bloqueada, fixada numa série de rigidezes físicas e intelectuais que tornam extremamente difícil o movimento de unir-se em torno da União Europeia; e, nesse contexto, retoma-se o desenvolvimento da luta de classes. O problema aí pode ser resumido em algumas perguntas: quais são as condições da luta de classes? Quais são as condições pelas quais nos libertamos desses patrões?
Insuportável é ver que tomam o dinheiro de cada trabalhador e o metem no bolso, e você, o trabalhador, vira mendigo. Todos temos de fazer essa revolução. Algum dia teremos de fazê-la. Toda a inteligência tem de ser mobilizada para resolver esse problema; o resto são estupidezes.
La Nación: Apesar da miséria europeia e, sobretudo, da miséria italiana, vê-se um momento muito prolífico no pensamento italiano. Talvez se possa dizer que o pensamento italiano é mais potente hoje, na América Latina, que na própria Europa…
Toni Negri: Hardt e Virno editaram, em meados dos anos 1990, um livro formidável, com contribuições fundamentais: Radical Thought in Italy: A Potential Politics (1996[2]). Incluía um capítulo de Virno, com o título de “Do You Remember Counterrevolution?” [Lembram-se da contrarrevolução?]. Nesse capítulo, ele joga com o fato de que, depois de 1848, fazia-se revolução na França e pensamento na Alemanha; e diz que, então, se fazia pensamento na França e revolução na Itália. É ideia bem bonita, não? Quando se puder dizer que se faz pensamento na Itália e revolução na América Latina, talvez tenhamos completado o movimento.
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[1] Ver resenha (“Commonwealth: amor e pós-capitalismo”, Bruno Cava, blog Outras palavras), em http://www.outraspalavras.net/2010/06/22/commonwealth-amor-e-pos-capitalismo/ [NTs]
[2] VIRNO, Paolo; HARDT, Michael (eds.), Radical Thought in Italy: A Potential Politics, Minneapolis, University of Minnesota Press, 1996 [NTs].
PS: “Título original: É necessário voltar às palavras que significam”2/11/2012, entrevista a Ariel Pennisi e Adrián Cangi, La Nación, Buenos Aires, Ar.
http://www.lanacion.com.ar/1522453-toni-negri-es-necesario-volver-a-las-palabras-que-significan-algo

sábado, 27 de outubro de 2012

Territorialidades corporativas 2

Excerto da tese Doutorado Dispositivos territoriais das redes mundiais, PUCSP, 2004. Clara Miranda
O comércio intrafirma acontece em firmas-rede, que são as mais características da produção flexível. Alguns dos segmentos interconectados são tanto autônomos quanto interdependentes da rede, podendo mesmo fazer parte de outras redes. A atuação dessas redes, segundo Manuel Castells (2000), depende de sua “capacidade de conexão”, quer dizer, da “sua capacidade estrutural para facilitar a comunicação livre de ruídos entre seus componentes; e sua consistência, ou seja, o grau até o qual se partilham interesses entre os fins da rede e os de seus componentes”.

A troca de componentes e de suprimentos para cadeias de atividades internacionalizadas intrafirmas têm alçado um alto volume no comércio internacional brasileiro. Das comutações globais, decorre a integração dos mercados, consolidada pela articulação em rede das firmas multinacionais entre sucursais, fornecedores e subcontratantes que representa cerca de 30% do comércio mundial e 50% das importações do Brasil (ANDREFF, op. cit).

Um dos determinantes principais do comércio exterior é a estratégia técnico-financeira da empresa transnacional para a integração industrial. Essa estratégia segue etapas, que envolvem a produção e a comercialização, visando a otimização da estratégia concorrencial global, com o objetivo de consolidar o grupo no mercado global.

A integração industrial transnacional enseja um importante comércio entre os segmentos da empresa-rede. Os preços que governam as transações intra-firma, denominados preços de transferência, possuem determinantes singulares, consistindo numa das vantagens da internacionalização para essas empresas. Destacam-se no comércio intra-firmas em território brasileiro, os grupos PHILIPS, a FIAT, BOSCH, VOLKSWAGEM e a GENERAL MOTORS, segundo a Secretaria de Comércio Exterior (SECEX) do Governo brasileiro (dados até 2004).

Uma das estratégias das firmas transnacionais é baseada na integração em níveis, na qual cada unidade da firma faz parte de uma seqüência da cadeia produtiva, desenvolvendo produtos de uma das etapas ou enviando suprimentos para uma unidade montadora. Esta estratégia atua sobre as importações brasileiras de material eletro-eletrônico, destacando-se a PHILIPS. Sua principal filial brasileira está sediada em Manaus, e é uma grande importadora de aparelhos e material elétricos. As suas compras externas foram realizadas basicamente das próprias filiais da PHILIPS, estabelecidas na China, Japão, Hong Kong e Singapura. Essas subunidades desenvolvem produtos, que são enviados para Manaus, que monta o produto final para venda no Brasil e para exportação. Ressalta-se que essas importações aproveitam o benefício fiscal da Zona Franca de Manaus, que é um fator determinante da concentração deste tipo de importação.

O grupo italiano FIAT é a oitava montadora mundial de automóveis, possuindo 16 fábricas no Brasil, a FIAT Automóveis se destaca entre elas, um dos maiores grupos industriais do país. Um dos fatores que marcam o intercâmbio entre Brasil e Itália é a estratégia técnico-financeira do comércio intrafirma da FIAT. Embora, o intercâmbio venha se reduzindo, componentes, partes e peças para a montagem de carros no Brasil continuaram a ser trazidos da Itália, beneficiando-se da baixa taxa de crescimento italiana e da estabilidade relativa do seu mercado no Brasil. A operação em rede da FIAT envolve acordos intersetoriais com a Siderúrgica USIMINAS, em sua estratégia de desverticalização, esta fornece peças especiais e presta serviços em mecânica e na manutenção de equipamentos.
A multilocalização, descentralização das operações na cadeia mundial de suprimentos e de distribuição da FIAT Automóveis

Global sourcing in the automotive supply chain: The case of Fiat Auto “project 178” world car
Arnaldo Camuffo and Giuseppe Volpato - Ca’ Foscari University of Venice, Italy
 
idem. 
Polos da FIAT Turkey (esq,/ azul), Poland (esq,/ grafite), Argentina (cinza); Italy (dir/ azul) and Brazil (dir/ dir- cinza). Camuffo & Volpato, idem

Territorialidades corporativas 1

Figura apenas firmas de commodities ligadas a minério, celulose e aço
Dois tipos de cadeias se sobressaem: as grandes manufaturas que coordenam as redes utilizando capital e tecnologia intensivamente, mas também obtendo retorno deste uso[1]; e, os grandes varejistas, que subcontratam firmas para realizarem o design de suas marcas. O primeiro modelo é característico de firmas de automóveis, microeletrônica, eletroeletrônica e mecânica pesada, que envolve o comércio intrafirma global relacionado ao Brasil (DUPAS, op. cit ver post anterior referência).


[1] 80% do fluxo de pagamentos internacionais de royalties e fees (transferência de tecnologia) pertencem a 100 maiores corporações do mundo (DUPAS, 2001).

Territorialidade do agronegócio

Excerto da Tese de Doutorado, Dispositivos territoriais das redes mundiais, 2004
Diagrama soja fluxos/ pólos e produtores maiores-hubs, Miranda, 2004


Detalhe das manchas de produção de soja Centro-Oeste/ BAHIA/Paraná/ Minas. Pesquisa de dados no Geipot. Inclui produção de minério/ aço e celulose. Pesquisa Clara Luiza Miranda desenho Patrícia Hulle. Valores em milhões de toneladas

MAPA DAS COMMODITIES
“Nada é mais desterritorializado que a matéria movimento, a matéria-fluxo é vetorial” Deleuze e Guattari
A nova configuração da circulação e a mobilidade geográfica intensiva que ocorrem no território brasileiro, nos anos 2000, advêm principalmente das novas fronteiras agrícolas: cerrados do Centro-Oeste, Triângulo Mineiro, Rondônia, Oeste da Bahia, sul do Maranhão e do Piauí. Estas regiões estão se tornando altamente modernizadas e especializadas, produzindo commodities, sobretudo soja e milho.
A longa distância da nova fronteira agrícola dos portos influi na configuração das redes de circulação, na medida em que multiplica os percursos possíveis no território e que enseja a possibilidade de ampliar o número de saídas, entradas e passagens para o interior do subcontinente.
Estas redes de transporte são açambarcadas imediatamente pelas corporações. Segundo dados da empresa Archer Daniels Midland, a ADM, as chamadas fronteiras logísticas em geral, são consideradas como as últimas etapas que podem ser exploradas para aumentar a praticabilidade das empresas, a fim de manter "vantagens diferenciais competitivas". Abrir novos fronts requer “as atividades logísticas, que afetam os índices de preços, custos financeiros, produtividade, custos de energia e satisfação dos clientes”.
(...)
A estratégia de multilocalização das firmas mundialmente, o intra-firm sourcing, gera lógicas organizacionais, que estruturam cadeias produtivas em forma de redes de empresas, de escala e vínculos diversos: filiais, terceirizações, subcontratações, parcerias. A organização do intra-firm sourcing superpõe-se em camadas, que vão configurando a flexibilização da produção no território, assim como a flexibilização das formas de trabalho, fragmentando-se em agentes menores, que podem gera formas de cooperação territorial tipo clusters, na medida em que se aproxima da base da cadeia expandida (DUPAS, 2001).
"As modificações ocorridas no seio das cadeias produtivas globais, alteram, pois, de modo decisivo, a forma como os países e os agente econômicos relacionam-se entre si, se apropriam da riqueza, alteram o mapa da produção mundial, a demanda por trabalho e a força relativa dos diversos grupos de trabalhadores" (DUPAS, 2001).
O padrão de distribuição territorial é variado, a unidade operativa é a rede e não cada uma das firmas individuais. O que torna a informação, que circula em redes e sub-redes crucial na realização das operações das cadeias produtivas (CASTELLS, 2001). (...)

Referências:
CASTELLS, Manuel. A Sociedade em redes. Tradução: Klaus Brandini Gerhrdt. São Paulo: Paz e Terra, 2000.
DUPAS, Gilberto. O Brasil, suas empresas e os desafios da competição global. In. BARROS, Betania Tanure (org.). Fusões, Aquisições & Parcerias. São Paulo, 2001.


hub/spoke


A rede teia será tratada mediante a expressão “tecido das relações sociais e produtivas” que podem se manifestar mediante “arquiteturas de comunicação” como: ponto-a-ponto e centralizadas hub/spoke, com ou sem integração horizontal feita ponto a ponto no conceito de todos-com-todos (federated), em formações complexas.

A arquitetura da rede centralizada é conhecida como hub/spoke, na qual o hub representa (geralmente) a grande organização, que centraliza as operações em torno de si, enquanto spokes (raios) são as atividades meio ou serviços. Sobretudo, são os circuitos, fluxos, teias, espaços que a circulação desenha, para além das determinações instrumentais e funcionais da produção fabril; é a circulação emancipada da produção.

Independente de uma arquitetura centralizada ou horizontal, as redes mundiais (do capitalismo contemporâneo, da produção flexível) são um “jogo das relações”. A conectividade das cidades globalizadas através das linhas difusas das circulações materiais e imateriais é referida a atributos de fluidez, de fluxo, de mobilidade e as porosidades que rejeitam os mosaicos e os limites.
 
Miranda, Clara Luiza. Tese doutorado. PUC SP. Dispositivos Territoriais das Redes Mundiais. 2004. Orientação Nelson Brissac

Território, territorialidades e redes teias


Ainda seguindo as três metáforas das redes: fluidos, teias e rizomas, sugeridas por Maria Ceci Misoczky, a ideia neste post é abordar as redes teias que caracterizam algumas das redes do modo de desenvolvimento contemporâneo, sobretudo as relativas aos centros de poder.
Dentre diversas questões que caracterizam o território, se diz que ele se organiza de acordo com certos critérios de partilha e de contiguidade, distância (e/ou de condutas sociais de estar junto ou separado; próximo ou distante; só ou em grupo).

De acordo com Milton Santos, em Território, Globalização e Fragmentação (1994), o  funcionamento do território ocorre de modo horizontal por (relação de vizinhança ou continuidade territorial e vertical ‑  mediante pontos distantes uns dos outros, ligados por múltiplas formas e processos sociais.
“ O território, hoje, pode ser formado de lugares contíguos e de lugares em rede: as redes constituem uma realidade nova que, de alguma maneira, justifica a expressão verticalidade. Mas além das redes, antes das redes, apesar das redes, depois das redes, com as redes, há o espaço de todos, todo o espaço, porque as redes constituem apenas uma parte do espaço e o espaço de alguns. São, todavia, os mesmos lugares que formam redes e que formam o espaço de todos” Santos apud ProexUFPE.
Seguindo este raciocínio de redes “hierarquizadas” face territorialidades

Retoma-se o espaço de representação em sua articulação entre o espaço da prática social e a sua materialidade imediata, com implicação temporal-espacial das representações sociais nos remete às relações de poder. O poder é correlato à noção de apropriação e à definição de papéis sociais hierarquizados. Assim uma das formas concretas de apropriação temporal-espacial mediada pelo poder é o território. Este fato assimila territorialidade e poder. No campo das representações sociais o desígnio adjacente de controle e legitimação na definição de territórios, é a noção de territorialidade.

O território é sinônimo de apropriação, de subjetivação fechada sobre si mesma. O seu conjunto dos projetos e das representações desemboca, pragmaticamente, em toda uma série de investimentos, nos tempos e nos espaços sociais, culturais, técnicos, cognitivos. Enfim, a territorialidade aparece nas representações sociais que visam definir as fronteiras de controle e apropriação de determinada realidade social.

Raffestin, no quadro da Geografia Política e se referenciando em Lefebvre, afirma que o território é um espaço modificado pelo trabalho e revela relações de poder . (Saquet. 75). Ele é objeto de relações sociais, de poder e dominação, o que implica a cristalização de uma territorialidade, ou de territorialidades no espaço, a partir de várias atividades cotidianas. Isso se assenta, segundo Raffestin, na construção de malhas, nós e redes, delimitando campos de ação e de poder nas práticas espaciais e constituem o território como materialidade . (Saquet. p76)

Raffestin denomina de sistema territorial o resultado das relações de pode entre Estado, empresas e outras organizações e indivíduos. Atores fazem uma repartição espacial, implantam os nós e constroem redes. Os sistemas territoriais asseguram a coesão espacial e o controle de pessoas e coisas. “As tessiduras, os nós e as redes são subconjuntos que sustentam as práticas espaciais, tanto econômica como política e culturalmente”, concretizando a produção territorial. Essas práticas se inscrevem no campo de poder de maneira relacional Raffestin se baseia em Foucault (Saquet. p, 76).

Raffestin diferencia atores sintagmáticos e atores paradigmáticos na produção do espaço. O ator sintagmático combina todas as espécies de elementos para produzir/ o Estado é o ator sintagmático por excelência. O ator paradigmático deriva de uma divisão classificatória/ critérios individuais e coletivos (apud Galvão; França e Braga.)

De acordo com Raffestin (apud Galvão; França e Braga) Estado e organizações para realizarem objetivos recorrem a estratégias.

Para designar a definição de estratégia recorre-se a Reffestin e a de Certeau. É o “uso do engajamento para fins de guerra” Raffestin (apud Galvão; França e Braga.). Mas, segundo Certeau aquelas práticas, que distinguem um lugar “próprio”, de onde se pode manipular as relações de força, são designadas estratégias. Estas são “um tipo específico de saber”, possuindo no poder a sua face “preliminar”. Certeau contrapõe as estratégias às táticas, que são recursos empregados quando não se domina um lugar “próprio”, quando se tem que jogar num terreno cuja a regra é exterior, e se ocupa o lugar do “outro”. Recorrem-se às táticas quando não se tem condições de possibilidade de um projeto global, e consequentemente, não se obtém individualidade institucionalizada no campo. Deve se operar por “astúcia” em relação ao tempo – aproveitar as “ocasiões”.

No dicionário Metapólis se abre outras vias de abordagem. A estratégia é uma lógica e a tática é um critério, o estratagema é um ardil. A estratégia se refere, pois, a uma lógica global capaz de dirigir as operações; a tática é um conjunto de regras e relações – o dispositivo operativo – necessário para facilitar a “evolução local”. O estratagema é contingente. (verbete Metapólis. p. 211)

Raffestin (apud Galvão; França e Braga, p. 38) diz ainda que as estratégias (militares e jogos) têm em comum: a energia (potencial que possibilita o movimento, a transformação da matéria) e informação (forma ou ordem detectada em toda matéria e energia).

O problema da circulação de informação – a amplitude da dominação do território depende da quantidade de energia disponível. “A circulação da informação estabelece uma comunicação que ocorre num campo de poder e todo poder é desempenhado no campo da comunicação” (Raffestin apud Galvão; França e Braga, p. 38).

A noção de poder multidimensional relaciona Raffestin e Foucault (conceito de biopoder).
Poder gera transmutação, Galvão; França e Braga, p. 40.

A separação entre energia da informação no nível do trabalho realiza fissura social (Raffestin apud Galvão; França e Braga, p. 40)  – tratar disso noutra ocasião.

Segundo Raffestin (apud Galvão; França e Braga, p. 40-41), o  território é um trunfo particular, recurso, entrave, continente e conteúdo, tudo ao mesmo tempo. O território é um espaço político por excelência, o campo de ação do poder. Ver p. 40-41 – CAMPO. Raffestin - espaço é matéria prima anterior ao território. A partir do espaço das ações de apropriações, conduzidas por atores ocorre a territorialização do espaço e o espaço é tornado produto. O espaço é modificado pelo trabalho então revelam-se relações de poder.

Produzir uma representação de espaço já é uma apropriação, uma empresa, um controle, portanto (Raffestin apud Galvão; França e Braga, p. 42).
 
A divisão da superfície: malhas, nós e redes, é um sistema de tessiduras  - nós e redes – organizadas hierarquicamente permitem assegurar o controle sobre aquilo que pode ser distribuído.

Para fazer uma representação moderna do espaço Raffestin (apud Galvão; França e Braga, p. 42 ver 43.-44) destaca a superfície ou plano, linha ou reta e o ponto como elementos essenciais – puro jogo estrutural que transcende os objetos representados mas preserva seus contatos, suas relações.

A territorialidade não é só modelo do espaço, mas também as características dos indivíduos e dos grupos que constituem um território (Galvão; França e Braga, p. 43).

Os cortes e recortes das tessiduras e as ligações entre os nós são explorados através dos conceitos de redes. Ver Galvão; França e Braga p. 44.

Os nós podem ser os centros de poder e de referências das aglomerações de diversas escalas, de indivíduos e de grupos. Os nós são interdependentes, precisam relacionar-se, comunicar-se.

A rede é compreendida na complementaridade entre circulação e comunicação: como fluxos materiais e imateriais (Galvão; França e Braga p. 44).

“A rede é proteiforme, móvel, inacabada, desta falta de acabamento tira sua força no espaço e no tempo (...). A rede faz e desfaz as prisões do espaço tornado território: tanto libera quanto aprisiona. É o porquê de ela ser o instrumento por excelência do poder” (Raffestin apud Galvão; França e Braga p. 44).

A rede descrita por Raffestin é a rede teia.

 

REFERÊNCIAS

GALVÃO; FRANÇA E BRAGA. O território e a territorialidade: Contribuições de Claude Raffestin. In SAQUET & SOUZA, Edson. Leituras do Concieto de Teritório. Expressão Popular, 2009
SAQUET. Abordagens e concepções do território. Expressão Popular, 2010
SANTOS, Milton.  Territorio, Globalização e Fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1994.  
PROEXUFPE.  O conceito de TERRITÓRIO segundo Milton Santos

ESPAÇO POSTULADO/ ESPAÇO PRODUZIDO

O espaço é um “fato” aberto há uma série de especulações. Metodologicamente (e didaticamente) podemos dividi-lo nas categorias espaço postulado[1] e espaço produzido como fez Fábio Duarte (2002). A definição de espaço infinito e abstrato da ciência moderna, que não corresponde as noções adquiridas com a vivência, só pode ser formulado mediante linguagem científica, só pode ser postulado. Mesmo a perspectiva central como técnica de representação do espaço, como construção geométrica, simbólica e ideológica determina um espaço postulado.
O espaço do convívio coletivo, que possui orientação, limites, fronteiras; objetos que o demarcam e obstruem, códigos que os representam e é apropriado pelas pessoas, é o espaço produzido socialmente. Contudo mesmo o espaço produzido carrega fatores ficcionais (ideológicos).
Com base em Henri Lefebvre, quer dizer, baseado em estudos da fenomenologia da gênese do urbano, Fábio Duarte subdivide a compreensão do espaço produzido em três categorias: o espaço praticado, o de representação e as representações do espaço. O espaço praticado é o que permite a formação lenta dos lugares, assegurando a coesão social e determinando segregações. O espaço de representação é o espaço simbólico, é o espaço do tecido social, repleto de signos e modos culturais de apropriação de seus objetos pelos habitantes. O espaço das representações é o espaço concebido. O espaço que “espelha” as relações de produção, a ordem social, a estrutura dos conhecimentos enuncia seus códigos. É o que tende a formar o sistema de signos do espaço (LEFEBVRE apud DUARTE, 2002, p. 43).

[1] Postulado: 1.Filos. Proposição não evidente nem demonstrável, que se admite como princípio de um sistema dedutível, de uma operação lógica ou de um sistema de normas práticas./  2.Fato ou preceito reconhecido sem prévia demonstração.

Com base no conceito de espaço produzido por Fábio Duarte, por sua vez, baseado em Henri Lefebvre. Neste se subdivide a compreensão do espaço produzido em três categorias: o espaço praticado, o de representação e as representações do espaço.

O espaço praticado é o que permite a formação lenta dos lugares, assegurando a coesão social e determinando segregações. O espaço de representação é o espaço simbólico, é o espaço do tecido social, repleto de signos e modos culturais de apropriação de seus objetos pelos habitantes. O espaço das representações é o espaço concebido. O espaço que “espelha” as relações de produção, a ordem social, a estrutura dos conhecimentos enuncia seus códigos. É o que tende a formar o sistema de signos do espaço (LEFEBVRE apud DUARTE, 2002, p. 43). Deste modo se sintetiza:

       espaço praticado→ lugar → pratica do  lugar →  espaço (LEFEBVRE / CERTEAU)

       espaço das representações → território 

DUARTE, Fábio. Crise das matrizes espaciais. Arquitetura, cidades, geopolítica, tecnocultura. São Paulo: Perspectiva, 2002

“Os territórios estariam ligados a uma ordem de subjetivação individual e coletiva e o espaço está ligado mais às relações funcionais de toda espécie. O espaço funciona como uma referência extrínseca em relação aos objetos que ele contém. Ao passo que o território funciona em uma relação intrínseca com a subjetividade que o delimita” Felix Guattari

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

três metáforas de redes


Seguindo as três metáforas das redes Maria Ceci Misoczky — fluidos, teias e rizomas como um, recurso discursivo que possibilita a revelação de multiplicidades, deslocamentos e rupturas.

No caso dos fluidos, quando Pierre Musso , destaca a abordagem mitológica, técnica, médica ‑ biologia, fisiologia, matemática que no Século XVIII indica a “saída do corpo”. Ou seja, a rede não é mais observada sobre ou dentro do corpo humano, ela pode ser construída (...). De natural ela vira artificial, de dada ela se torna construída (...).  A rede pode ser construída porque ela se torna objeto pensado em sua relação com o espaço. Ela se exterioriza como artefato técnico sobre o território para encerrar o grande corpo do Estado-Nação ou do planeta. Para se tornar operacional como artefato a rede deveria ser pensada como conceito. De efeito de rede a ordem de rede.

Os exemplos vieram de engenheiros geográfos e do engenheiro urbanista Ildefonso Cerdá que dizia: “...elementos constitutivos y esenciales (de la influencia transformadora de la nueva civilización de la era industrial del vapor: movimiento y comunicatividad)” (Cerdá TGU_ Teoria Geral da Urbanização). O capítulo sobre “Linhas, Redes e fluxos” In Cidade do Século XIX, Guido Zucconi também ajuda a expor a metáfora da rede fluido.

A rede teia será tratada mediante a expressão “tecido das relações sociais e produtivas” que podem se manifestar mediante “arquiteturas de comunicação” como: ponto-a-ponto e centralizadas hub/spoke, com ou sem integração horizontal feita ponto a ponto no conceito de todos-com-todos (federated), em formações complexas.

A arquitetura da rede centralizada é conhecida como hub/spoke, na qual o hub representa (geralmente) a grande organização, que centraliza as operações em torno de si, enquanto spokes (raios) são as atividades meio ou serviços. Sobretudo, são os circuitos, fluxos, teias, espaços que a circulação desenha, para além das determinações instrumentais e funcionais da produção fabril; é a circulação emancipada da produção.

Independente de uma arquitetura centralizada ou horizontal, as redes mundiais (do capitalismo contemporâneo, da produção flexível) são um “jogo das relações”. A conectividade das cidades globalizadas através das linhas difusas das circulações materiais e imateriais é referida a atributos de fluidez, de fluxo, de mobilidade e as porosidades que rejeitam os mosaicos e os limites.

Mesmo, Michel Serres (1994) enfatiza o papel das malhas e das teias: “que interessam os lugares de armazenamento [hubs], se as redes os interconectam? (...) Quando o estoque se identifica com o fluxo, as grandes concentrações dispersam-se em singularidades”.

Já as características aproximativas de rizoma/ rede são tradadas por Virginia Kastrup com interlocuções com Pierre Levy; e também Suely Rolnik e o próprio Mil Platôs.

sábado, 13 de outubro de 2012

3 respostas à pergunta: O que é uma informação?


Informação, Latour/ Hermandt. Redes que a rezão desconhece: laboratórios, bibliotecas, coleções In Tramas da rede (Parente –org. Ed Sulina,  2010)
Informação não é um signo e sim uma relação estabelecida entre dois lugares — o primeiro se torna periferia e segundo se torna um centro, sob a condição de que entre os dois circule um veículo que denominamos muitas vezes de forma, mas que para insistir em seu aspecto material Latour/ Hermandt chamam de inscrição.

O que é uma informação? Não é inicialmente um signo e sim o carregar em inscrições cada vez mais móveis e cada vez mais fiéis, de um número maior de matéria.

A produção de informações permite resolver de modo prático, por operações de seleção, extração, redução, a contradição entre presença  e a ausência num lugar. Para compreendê-la é preciso se interessar pelas instituições que permitem as relações de dominação e pelos veículos materiais que permitem o transporte e o carregamento.

Diagrama de Latour e Hermandt informação
Algo próximo ao que diz Marshall Mcluhan “o meio é a mensagem” (a forma de um meio incorpora-se na mensagem, criando uma relação simbiótica, que o meio influencia o modo como a mensagem é percebida).

Latour/ Hermandt ressaltam que o signo não remete de início a outros signos e sim ao trabalho de produção concreto, material.

Informação, Vilém Flusser (a partir de Marcos Beccari. Blog Filosofia do design)
FLUSSER, Vilém. Mundo Codificado.
Design e comunicação são, para Flusser, desdobramentos interdependentes de um mesmo fenômeno, a saber, o processo de codificação da experiência. Significa que projetar é in-formar, isto é, dar forma à matéria seguindo uma determinada intenção. De-sign (por/ colocar signos).  Logo, o produto de design é ao mesmo tempo modelo e informação: ao transformar as relações entre o usuário e seu entorno, atribui uma função e um significado ao mundo.

A variação de forma/aparência entre objetos destinados a uma mesma utilização é imensa.  Dado que projetar e in-formar são aspectos de uma única ação, rejeita-se a dicotomia clássica entre representação e referente, signo e objeto, teoria e prática, etc.

De acordo com o pensamento de Flusser, design se torna indistinguível de comunicação ou linguagem na medida em que sinaliza a singular tentativa humana (natural) de impor sentido ao mundo por meio de códigos e técnicas (artificiais). Em suma, significa enganar a natureza por meio da tecnologia – ou simplesmente produzir cultura. Ou seja, realidade, vivenciada coletivamente, se torna real a partir de palavras, imagens e artefatos.Não se trata de um mundo à parte, mas da reconstrução de um mesmo mundo cuja lógica permanece à margem da distinção material-imaterial. “Revela-se, com isso, outro paradoxo: embora o ato de in-formar seja natural ao ser humano, o excesso de informação nos conduz à desagregação de sentido.” (Flusser apud Becari).

Informação, Deleuze
Num primeiro sentido, a comunicação é a transmissão e a propagação de uma informação.

Ora, o que é uma informação?

Não é nada complicado, todos o sabem: uma informação é um conjunto de palavras de ordem. Quando nos informam, nos dizem o que julgam que devemos crer. Em outros termos, informar é fazer circular uma palavra de ordem.

As declarações da polícia são chamadas, a justo título, comunicados. Elas nos comunicam informações, nos dizem aquilo que julgam que somos capazes ou devemos ou temos a obrigação de crer. Ou nem mesmo crer, mas fazer como se acreditássemos.  Não nos pedem para crer, mas para nos comportar como se crêssemos. Isso é informação, isso é comunicação; à parte essas palavras de ordem e sua transmissão, não existe comunicação. O que equivale a dizer que a  informação é exatamente o sistema do controle. Isso é evidente, e nos toca de perto hoje em dia.

No entanto, Deleuze em O Ato de Criação, 1987, diz: suponhamos que a informação seja isso, o sistema controlado das palavras de ordem que têm curso numa dada sociedade.

Mas ter uma ideia não é da natureza da comunicação.

Qual a relação entre a obra de arte e a comunicação?

Nenhuma, diz Deleuze. A obra de arte não é um instrumento de comunicação. A obra de arte não tem nada a ver com a comunicação. A obra de arte não contém, estritamente, a mínima informação. Em compensação, existe uma afinidade fundamental entre a obra de arte e o ato de resistência. Isto sim. Ela tem algo a ver com a informação e a comunicação a título de ato de resistência.